A cultura do crime

Os jornais trazem hoje uma história abominável. Em 2015, no Piauí, quatro meninas adolescentes saem para passear. Sobem a um morro, o morro do Garroto, lugar turístico, para tirarem fotos. Lá, são atacadas por quatro rapazes, adolescentes eles também. São comandados por um adulto, de 43 anos. Elas são estupradas e uma é assassinada. A notícia vem publicada agora porque o julgamento do adulto que chefiou o bando terminou ontem, dia 27. 

M, le maudit de Fritz Lang



Mas o horror não cessou aí.




Os quatro garotos foram internados num Centro Educacional Masculino, onde ficaram juntos.





Um dos meninos havia delatado o acontecimento. Os outros o mataram a socos e pontapés, nesse centro onde cumpriam "medida socioeducativa".





São garotos que obedeceram a leis não escritas.  Elas dizem que um delator é abjeto e deve ser punido. A formação infeliz que tiveram inculcou neles esse princípio. Fizeram justiça à moda deles. Mas há aqui um réu maior, que é a própria Justiça oficial e seus executores.




Desde que terminou M, o vampiro de Dusseldorf, em 1931, Fritz Lang passou a voltar, obsessivamente, sobre o tema da justiça. Lang é um realizador filósofo, construindo seu pensamento com os filmes que realiza. 






A cada filme, ele revela, mais e mais, que a justiça não é apenas inútil, mas uma aberração inominável, inapreensível, sem formas, com imenso apetite devorador. Ela é pior que os piores delinquentes porque tem dentro de si, instrinsecamente, pavorosamente, ontológicamente, a mostruosidade perversa e criminosa.

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Seu rigor é, ele próprio, absurdo. Um exemplo: o adulto que comandou o bando assassino foi condenado a 100 anos de prisão. O que significa isso? Por que não 99 ou 108? São números que brotam de uma aritmética enlouquecida.



E o que acontecerá com esse homem? Ele encarna uma disfunção social que, num mundo melhor, deveria ser tratada.





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