A revolução que ocorreu dentro do renascimento italiano em Pádua, a partir da metade do século 15, até agora, ao menos me parece, não foi esclarecida de todo.
Uma explicação mecânica e imediata, a mais frequente, atribui à presença de Donatello em Pádua, de 1443 a 1453, a razão dessas mudanças cruciais. Ao exportar seu grande artista, Florença exportava também sua cultura, que seria assimilada em um novo meio. É impossível minimizar o impacto que a personalidade gigantesca de Donatello pôde causar no meio paduano. No entanto, minha impressão é que predomina, nas análises feitas pelos historiadores sobre esse período, uma relação em sentido único, ou seja, a marca deixada por Donatello em Pádua.
Ora, parece-me que, deslocando-se para o norte, Donatello também se modificou, tanto quanto foi capaz de provocar modificações.
Se é possível encontrar algumas vezes, não muito frequentes, nos anos que precedem sua viagem de Florença a Pádua, uma sensibilidade de observação para os modelos concretos da antiguidade, como na maravilhosa Virgem da Anunciação, em Santa Croce (1435 circa), cujo panejamento, ao mesmo tempo amplo e delicado, vivo em sua agitação, demonstra a sensibilidade para a escultura antiga,
é em Pádua que o modelo da antiguidade se impõe com plenitude. Assim, Donatello transforma a Madona e o Menino, da basílica de Santo Antônio, em uma deusa Ceres, sentada em um trono ornado por bizarras esfinges. A postura majestosa não conflita com a formidável animação tanto nas roupas quanto na vivíssima postura do menino Jesus. Um classicismo que parece já respirar ares "proto -maneiristas" - ousando empregar uma expressão não muito ortodoxa neste caso.
Donatello fora chamado a Pádua para a realização dessa escultura cuja novidade é radical. Trata-se do primeiro monumento equestre realizado desde a antiguidade romana. Enorme proeza técnica foi fundir esse bronze de 140 x 390 cm. (medidas sem a base). Nele, o condottiere demonstra um sereno domínio de si. Há algo de neoplatônico nesta suprema serenidade, algo de florentino, portanto. Mas os modelos deviam ser, obrigatoriamente, os que a antiguidade legara: a estátua equestre de Marco Aurélio, em Roma, e os cavalos gregos instalados no topo da basílica de São Marcos, em Veneza.
Que seja Pádua a ousar tal encomenda não é indiferente. Porque, ali, a cultura do renascimento se renovava em suas inquietações. Pádua, ao contrário de Florença, meio livremente especulativo, era uma cidade universitária, com gosto pela erudição filo-arqueológica. Teve também um núcleo de interesse pela observação dos modelos antigos, núcleo formador essencial e mal conhecido, com o ateliê escola de Squarcione. As novas inflexões na arte de Donatello mostram uma relação de duas vias: o grande escultor marcou e foi marcado pela cultura paduana.
Estas inquietações são de um diletante, em nada especialista nessas coisas. Quem sabe de tudo isso, no Brasil, é Nancy Kaplan, especialista na Pádua do século XV. Ela, ou quem mais seja, que assinale todas as bobagens que eu não deixei de escrever aqui.
Ora, parece-me que, deslocando-se para o norte, Donatello também se modificou, tanto quanto foi capaz de provocar modificações.
Se é possível encontrar algumas vezes, não muito frequentes, nos anos que precedem sua viagem de Florença a Pádua, uma sensibilidade de observação para os modelos concretos da antiguidade, como na maravilhosa Virgem da Anunciação, em Santa Croce (1435 circa), cujo panejamento, ao mesmo tempo amplo e delicado, vivo em sua agitação, demonstra a sensibilidade para a escultura antiga,
é em Pádua que o modelo da antiguidade se impõe com plenitude. Assim, Donatello transforma a Madona e o Menino, da basílica de Santo Antônio, em uma deusa Ceres, sentada em um trono ornado por bizarras esfinges. A postura majestosa não conflita com a formidável animação tanto nas roupas quanto na vivíssima postura do menino Jesus. Um classicismo que parece já respirar ares "proto -maneiristas" - ousando empregar uma expressão não muito ortodoxa neste caso.
Grande obra-prima o Cristo crucificado que pertence ao mesmo conjunto brônzeo da basílica paduana. Menos dramático do que tranquilo, ele é a testemunha de um olhar empírico do escultor, renovado pela observação anatômica:
Os relevos contando a vida de Santo Antônio, destinados a compor o conjunto do altar, adquirem uma grandeza equilibrada graças ao desdobramento largo do espaço arquitetural.
O único momento em que Donatello se entrega às suas pulsões "expressionistas" durante seu período em Pádua (eu ousaria dizer pulsões "gótico-expressionistas", que ele iria exacerbar na velhice), está no relevo que figura a Deposição de Cristo", esculpido em pedra de Vicenza, também para o altar da basílica.
É bem difícil encontrar, na obra de Donatello, a "nobre simplicidade e calma grandeza", a serenidade que caracteriza o espírito clássico. Tudo, ou quase, em Donatello é vital e vibrante. Creio porém que sua grande criação, na qual o classicismo aflora indiscutível, seja o monumento a Gattamelata.
Donatello fora chamado a Pádua para a realização dessa escultura cuja novidade é radical. Trata-se do primeiro monumento equestre realizado desde a antiguidade romana. Enorme proeza técnica foi fundir esse bronze de 140 x 390 cm. (medidas sem a base). Nele, o condottiere demonstra um sereno domínio de si. Há algo de neoplatônico nesta suprema serenidade, algo de florentino, portanto. Mas os modelos deviam ser, obrigatoriamente, os que a antiguidade legara: a estátua equestre de Marco Aurélio, em Roma, e os cavalos gregos instalados no topo da basílica de São Marcos, em Veneza.
Que seja Pádua a ousar tal encomenda não é indiferente. Porque, ali, a cultura do renascimento se renovava em suas inquietações. Pádua, ao contrário de Florença, meio livremente especulativo, era uma cidade universitária, com gosto pela erudição filo-arqueológica. Teve também um núcleo de interesse pela observação dos modelos antigos, núcleo formador essencial e mal conhecido, com o ateliê escola de Squarcione. As novas inflexões na arte de Donatello mostram uma relação de duas vias: o grande escultor marcou e foi marcado pela cultura paduana.
Estas inquietações são de um diletante, em nada especialista nessas coisas. Quem sabe de tudo isso, no Brasil, é Nancy Kaplan, especialista na Pádua do século XV. Ela, ou quem mais seja, que assinale todas as bobagens que eu não deixei de escrever aqui.
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