Bem sei que na ordem dos interesses do dia, falar sobre o filme de Todd Phillips, Joker, seria mais propício e também denotaria maior força centrífuga para o texto. Mas, no entanto, após assistir a 3 From Hell, de Rob Zombie, o ideal seria entrelaçá-los. Primeiro pela força comercial, com ampla distribuição do primeiro – que contraria a própria proposta do roteiro –, e depois isso acarreta no número de espectadores, vertiginosamente maior do que o alcance do filme de Zombie poderia sonhar. Mas, nesta primeira parte, falaremos de modo mais específico de Joker.
Joker, está claro, tem como protagonista um dos maiores vilões
da história do Batman. Este, por sua vez, não aparece no filme e tem um pequeníssimo
papel enquanto criança. Coerente, é a vez da história ser narrada a partir daquilo
que o mundo chama de bandido. A primeira pergunta que me fiz antes do filme
estrear era: Por que Joker? Pensando na multiplicidade de antagonistas do personagem
obscuro de Gotham City: Riddler, Two-Face, Ventriloquist etc, todos com
potencialidades formidáveis para se pensar em um caráter dual da violência em
nossa contemporaneidade. A escolha parece certeira, principalmente levando em
conta o impacto que o personagem tem na história do cinema, a linhagem era
grande e, por vezes, de respeito. O mundo de Gotham City é por excelência o da
distorção, das ambiguidades, assim como o herói da cidade é dúbio, nada mais
respeitável que seus antagonistas também o sejam.
Não vou comentar o filme e também da espetacularização dos
elementos postos em jogo nele. As opiniões estão aos montes e se repetem em uma
velocidade muito estonteante. Prefiro agora outro caminho. Mas é preciso acrescentar
algo: Me parece claro que o filme trabalha nessa chave: o debate, os coraçõezinhos
e as carinhas nervosas da internet fazem parte da estratégia. Somos levados para amar ou odiar, e falar sobre a polarização faz parte dos
interesses do enredo. Em um mundo tão dual como o nosso, é uma boa saída para
que o filme tenha forte repercussão.
E o filme não leva sua história para consequências mais
devastadoras, é limitado em algum aspecto. Em último grau aplaudimos uma visão
estreita, mecânica e, como mencionado, polarizada do que se propõe. Não reflete,
apenas confirma dados de nossa contemporaneidade, aquela da sociedade polarizada e binária. Podemos perceber que esse
caráter demonstrativo, diferente da visão analítica pode ser vislumbrada no
eixo eufórico ou disfórico da crítica.
Se isolarmos suas qualidades cinematográficas encontramos uma
boa direção, privilegiando os atores. A proximidade com Joker e uma maneira bem
afastada de Murray, nos impede criar vínculos com o personagem de Robert de
Niro, o conhecemos apenas pela sua superfície de apresentador, as agruras e as
dores não importam, só interessa o que acontece com Joker, um Joaquin Phoenix
raquítico e concebido como um saco imenso de problemas empilhados. A lembrança de The King of Comedy (1983), de Martin Scorsese parece ecoar no filme
de Phillips. A presença de Robert de Niro, o comediante frustrado, de 1983, e o
respeitado apresentador-comediante, em Joker, potencializa os limites polarizados
e binários do filme. Em ambos os casos como lidar com o fracasso e a implicação
da crueldade e maldade da sociedade nele são postos em evidência.
Mas o final me parece perdido. As situações aparecem
desconectadas, deixando quase hercúleo o trabalho do espectador que precisa
montar mentalmente os fatos. Como se a produção tivesse acelerado o processo de
uma hora para outra, para dar conta de vai lá saber o quê. Os últimos 15
minutos são bem diferentes do resto do filme.
A violência como matéria-prima, ou, mais especificamente
como desencadeamento social, é bem trabalhada no cinema. A empatia nos faz
duvidar da maldade ou bondade de determinados personagens; mas de modo tão
radical como indicada na trilogia de Rob Zombie, aparece certamente com maior
raridade, e esse é assunto para a Parte 2 desse post.
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