Um artista está sendo redescoberto pouco a pouco: Felix Nussbaum. Judeu alemão, de Osnabrück, veterano da primeira guerra mundial, viveu na Itália, depois na Belgica, fugindo da Alemanha nazista. Foi capturado e enviado para Auschwitz com sua esposa, onde ambos foram assassinados.
Nussbaum é um pintor notável, cujas obras o aproximam da Nova Figuração alemã. Seu modelado é poderoso e ele sabe dominar a luz que inquieta. A grande originalidade em sua obra é que a força pictórica está a serviço de um testemunho. Pinta as angústias criadas pelas perseguições e pelas piores experiências.
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Felix Nussbaum - Autorretrato com passaporte judeu - 1943 - Felix Nussbaum Haus - Osnabruck |
Nussbaum fez este autorretrato quando vivia clandestinamente na Bélgica. O modo de mostrar a estrela amarela e seu passaporte denuncia a infâmia. O passaporte venceu; ainda assim, com a estrela, são os únicos documentos de identidade que possui. No papel oficial está escrito seu nome. Ele vem carimbado em vermelho com as palavras JUIF - JOOD, que quer dizer judeu, em francês e flamengo, as duas línguas oficiais da Belgica. Mas apagaram sua cidade de nascimento.
Nussbaum está confinado contra o ângulo de um muro alto, sob nuvens escuras. É uma vítima do mal, do mal absoluto, prestes a ser capturada.
Nussbaum pintou vários autorretratos. Para contrapor à sua imagem acuada, escolho um outro, de 1942, muito belo. Mostra o casal, o pintor e sua esposa. Contém algo de uma alegoria misteriosa marcada pelo erotismo. As calças abertas que caem, revelando os pelos pubianos, a mulher nua, sugerem o ato amoroso acontecido ou por acontecer. O jornal, Le Soir, foi jogado displicentemente e Nussbaum pisa nele: nesse momento, a terrível atualidade conta menos do que o afeto. No fundo, abre-se uma perspectiva que evoca a pintura de Paul Delvaux.
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Felix Nussbaum, Autorretrato com Felka Platek, 1942 |
Em 1931, Nussbaum criou uma cena imaginária na Pariser Platz, de Berlim. Um bando em desordem de jovens artistas vestidos com roupas claras carregam suas obras nas portas da Academia de Belas-Artes. Os acadêmicos desfilam alinhados, com ternos pretos e cartolas. Max Liebermann, o diretor da Academia, pinta seu retrato no alto de um edifício em ruínas, no meio de figuras alegóricas que esvoaçam. Mocidade contestadora sonhando com um mundo mais livre e mais belo.
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Felix Nussbaum - A grande praça - 1931 - Museu de Arte Moderna de Berlim |
Não é possível que, então, ele pudesse se imaginar pintando, dez anos depois, A tempestade ou os exilados.
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Felix
Nussbaum - A tempestade ou Os exilados - 1941
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E que, mais três anos, algumas semanas antes de partir para Auschwitz, em 1944, terminaria O triunfo da morte.
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Felix Nussbaum - O triunfo da morte - 1944 |
O cavalo do mal galopa rápido.
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