Sérgio e Baco

A Bibliotheca Hagiographica Graeca (BHG) de 1624 aponta que Sergio e Baco foram dois soldados do período de Galerius Maximianus (305–311 d. C.) Existem controvérsias quanto ao período de atuação dos dois mártires, a discussão da data você pode encontrar no artigo de David Woods


A lenda diz que Sérgio era um oficial superior, um primicerius, dentro de uma das unidades de guarda-costas imperial, a schola gentilium, na qual Baco também servia como um de seus colegas oficiais, o secundocerius. Ao que parece, a dupla era uma das preferidas do imperador Maximiano, claro, isso despertou a inveja de outros membros da schola gentilium. Os invejosos logo espalharam o boato que Sérgio e Baco seriam cristãos. Lembrando que a lei de Maximiano exigia que todos adorassem os deuses pagãos, a fofoca ainda os acusava de persuadirem outros guardas a se converterem ao cristianismo. O imperador não acreditou nos informantes, mas decidiu fazer um teste. Promoveu uma oferenda de sacrifício ao templo de Zeus ordenando que toda sua escolta o acompanhasse na cerimônia. Estavam todos presentes, exceto Sérgio e Baco. Como castigo, o imperador obriga Baco e Sergio a voltarem ao palácio acorrentados e com roupas femininas. Ambos foram presos, torturados e condenados à morte.

Há um livro polêmico, menos pelo tema e mais pelo tratamento das fontes e documentos, publicado em 1994 pelo historiador John Boswell(1947-1994). Em Same-Sex Unions in Premodern Europe Boswell afirma a união amorosa entre homens era sancionada pelas igrejas Romana e Bizantina.  

Arca dei santi Sergio e Bacco, 1179, autor desconhecido, pedra. Acervo: Museu de arte do Castelvecchio, Verona, Itália.

No museu de arte do Castelvecchio há um sarcófago dos mártires cristãos. O trabalho tenta narrar a trajetória dos dois homens. 

Detalhe do sarcófago de Santo Sergio e Baco, 1179, pedra. Acervo: Museu de arte do Castelvecchio, Verona, Itália. Imagem de Getty Images.

Detalhe do sarcófago de Santo Sergio e Baco, 1179, pedra. Acervo: Museu de arte do Castelvecchio, Verona, Itália. Imagem de Getty Images.

No sarcófago há ainda a cena da captura (talvez já vestidos com roupas femininas) e também o enfrentamento com o imperador até a decapitação de um dos soldados.


Capela Abu Serga and Bakha (Santos Sergio e Baco), século XIII, Cairo, Egito.

Detalhe da Capela Abu Serga and Bakha (Santos Sergio e Baco), século XIII, Cairo, Egito.

No Cairo, Egito, há uma igreja dedicada a São Sérgio, chamado de Abu Serga. Aos modos da cultura bizantina, a imagem plana exibe dois homens em pé, ornamentados com vestes clericais, possuem fisionomias muito semelhantes, sendo diferenciados pelas roupas e gestos. Entre os dois modelos um pequeno suporte para acomodar um livro aberto. Os dois seguram uma cruz na altura do peito e possuem olhares que se desencontram.  

Tempera em madeira, autor desconhecido, c. 1300. Wadi el-Natrun, Monastério Sírio .

A imagem dos dois santos propagou-se e a mudança perceptível é que os corpos se aproximaram conforme o tempo.  

Santos Sérgio e Baco, autor desconhecido, c. 1280, Sinai, Egito.


Montados em cavalos, a dupla passou a ser apresentada não mais como duas figuras estáticas, mas alguma ideia de movimento contaminou as representações dos santos. 

Mar Sarkis (São Sérgio) em Maalula, Síria


Outros personagens entram em cena. As posturas ganham ornamentos e roupas suntuosas, esquecemos as menções de torturas pelas quais passaram os dois homens.


O fotógrafo britânico, Anthony Gayton, conhecido por recriar temas bíblicos, não deixou de fora os dois mártires. A cena criada é explicitamente erótica. Sérgio tem seus braços amarrados acima da cabeça. Parece não suportar o peso de seu corpo que se projeta para a pilastra, os joelhos flexionam como sinal de fraqueza.  Ele olha para cima como se esperasse a ajuda divina. Baco está do lado oposto da cena, ajoelhado, tem as mãos atadas atrás das costas. Seu tronco se inclina para o lado direito da cena. Sua boca semiaberta se direciona na altura do quadril de Sérgio, inevitavelmente tocará o sexo do parceiro. A cena de felação estaria pronta, bastaria desnudar Sérgio. Acima dos dois santos, Gayton apropriadamente insere dois salmos:
89:33 “But I will not take my love from him, nor will I ever betray my faithfulness.” (Mas nunca abandonarei o meu amor leal por ele. Nem serei desleal à minha promessa).
E o salmo 119:86 “All thy commandments are faithful, they persecute me wrongly; help thou me.” (Todos os teus mandamentos são confiáveis. Sou perseguido sem nenhum motivo. Ajuda-me!)

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