Cartazes rasgados

Jacques Villeglé completará 93 anos em março que vem. Desde 1949, procura cartazes nas ruas. É preciso que estejam colados uns sobre os outros, oferecendo camadas que se estragam e rasgam de maneira aleatória. Formam brechas que interrompem a imagem da superfície para revelar aquela que está por trás.

Começou com seu amigo, o fotógrafo Raymond Hains. Em fevereiro de 1949, criaram este Ach Alma Manetro, titulo que provém de letras que podem ser encontradas no acaso dos rasgos. Triunfo plástico que resulta num poema letrista.

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Villeglé transformou-se num arqueólogo das ruas. À força plástica, acrescenta-se a presença da memória coletiva, fazendo ressoar o sentimento de efêmero. 

Ele ajuda o acaso e rasga também, depois de descolar cuidadosamente esses restos de publicidade e levá-los para casa. Quando, numa parede, um acúmulo espesso de cartazes o atrai, espera que "amadureça", que fique no ponto de satisfazê-lo. Sabe distinguir as qualidades materiais do papel, de dureza, resistência, flexibilidade, diferentes se exposto ao sol ou se protegido dentro do metrô, por exemplo.

Lille, rue Littré , fevereiro de 2000



Uma atividade como essa não parece hoje muito nova: Mimmo Rotella [1918-2006] adquiriu celebridade com uma prática semelhante. Rotella (falecido em 2006), transformava seus cartazes em múltiplos, como este Divorzio all'italiana





 A força original de Villeglé nunca foi superada. Ele se tornou de fato conhecido a partir dos anos 1990. No entanto começou a produzir bem antes de Rotella. Suas obras são mais vastas e mostram uma afirmação significante maior.

Jacques Villeglé au [mac] de Marseille | Rue des Prouvaires, novembro 1959



Seus painéis respiram com o fôlego próprio à pintura de história (compreendendo aqui os grandes quadros celebrando episódios como "O Grito do Ipiranga"). Uma pintura de história crítica, capaz de incorporar as celebrações publicitárias como marcas do tempo e provocar comentários surpreendentes entre as imagens que, perturbadas pelas lacerações, se interpenetram. 


Jaqcques Villeglé - Carrefour Sèvres - Montparnasse, juillet 1961


Villeglé sintoniza-se com tudo o que pode intervir de maneira menos ordenada e obediente no espaço público. Têm, naturalmente, afinidades com os grafiteiros e pichadores.


Jacques Villeglé, Rue du Temple, 1968

Ele incorpora cartazes pichados. Assim, retratos do candidato Mitterand à Presidência mostram um bigodinho hitleriano desmistificador. 

Jacques Villeglé, Les Présidentielles, 1981.


Jacques Villeglé  dia 7 de abril de 2016 na galeria G.-Ph. & N. Vallois em Paris (fotografia de François Poivret)

Comentários

  1. Uau, que obra maravilhosa essa do Jacques Villeglé, einh.
    Desde muito criança que sou fascinado por cartazes de rua. Uma pena que aqui por São Paulo ao menos não é possível realizar esse tipo de trabalho. Há décadas que colar cartazes em paredes é proibido (inclusive já fui abordado pela polícia militar por colar cartaz, levaram o pouco dinheiro que eu tinha e fui liberado), até os grandes outdoors foram banidos.

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